segunda-feira, 29 de maio de 2023

 Tom Jobim com Vinícius de Moraes e João Gilberto

Tom Jobim em Hollywood anos 60


"A cana veio de fora, o boi, o cavalo, o jumento, o café, várias árvores, várias culturas, o povo veio de fora, a língua veio de fora, até os índios que são os mais antigos, vieram da Ásia. O choro e o maxixe, o maxixe que deu origem ao samba nasceu da mistura de ritmos europeus com ritmos africanos. Enfim as culturas estão exercendo influência e recebendo influencia desde sempre. Tudo se comunica"


Tom Jobim 


"O Rio de Janeiro que me inspirou era o Rio da natureza, do mar, do entardecer, dos casais, o riso, a lágrima da namorada, a rua Montenegro era tranquila, hoje o Rio de Janeiro está sendo coberto por um rio de aço (trânsito pesado na cidade toda) eu busco me afastar desse fluxo pesado. Já tentei me inspirar nisso, mas não consigo." (Início dos anos 70)


" A Bossa Nova teve um efeito semelhante ao de Pelé e Garrincha, estimulou a juventude a pegar uma bola e um violão e imitar a gente. Mas tem que evitar a mera imitação para exportação, tem que criar, trazer o novo. A harmonia, a melodia e a letra da Bossa Nova, comigo, João Gilberto, e Vinícius, inovou, -- trouxe algo novo.''


" A música brasileira fazendo sucesso nos EUA é como o irmão pobre ajudando o irmão rico. Tico-Tico no Fubá, Carmem Miranda, Ary Barroso, Dorival Caymmi, Bossa Nova, o Brasil oferecendo uma música diferente e bonita."


" Eu não sou um showman, comecei como arranjador no background, mas produzir, compor, é oferecer muito ao público, a criação é um ato de amor. Não apareço muito em público, mas produzo muito" (Anos 70 antes da Nova Banda)


" A música popular bem elaborada é tão perene, e fica para a posteridade como a música erudita"


" Parei de compor com o Vinícius porque surgiu uma agenda pesada para nós, muitos compromissos, mas trabalho para voltar a compor com o Vinícius. Muita gente pede."


" Eu sou de uma época e de uma cultura que eram contrárias ao artista ficar rico. Diziam que manchava a arte. Bonito era morrer na rua da amargura, tuberculoso num bar.  O empresário da rádio, da TV, da gravadora, da casa de show podia ganhar dinheiro e o criador da obra não. Um absurdo!  Outros diziam que o artista virava capitalista"


"A gente supera todas as adversidades, leva a música de um país pouco conhecido, outro tipo de música, outra língua, para competir com uma poderosa indústria, consegue vencer e ser reconhecido e no nosso país, alguns vêm dizer que a gente faz música de americano para americano."


" Eu nunca fiz só música do tipo Bossa Nova, fiz valsa, choro, moda, seresta, samba-canção, sinfonia. João Gilberto gravou todo tipo de música. Hoje um músico aperta uma tecla de um sintetizador, põe uma batida de Bossa Nova e diz que é Bossa Nova."


"

Eu acho que quando você faz música, dissolve a depressão. O piano funciona como um espelho na correção de meus defeitos, eu procuro uma harmonia, uma coisa boa."


(…) A música tem que levar ao reflorestamento, ao amor aos bichos, à família. Caetano Veloso disse:


“O Brasil tem que merecer a Bossa Nova”. 


"(…) Ter uma mulher bonita, ir à praia, navegar num barquinho no mar azul. "


O conselho da Bossa Nova é de levar a pessoa à vida…”


Tom Jobim

14 de Janeiro de 1995


Antônio Callado na Folha de são Paulo fala de uma homenagem a Tom Jobim no Jardim Botânico 


dificuldade –como tem sido a minha– de evocá-lo satisfatoriamente. Tom tinha uma qualidade de fantasia, de "whimsey", difícil de captar. Acho que ele jamais foi visto objetivamente irritado com alguém, alguma coisa, argumentando contra.

Sua tendência era quebrar a realidade, seu gênio era partir o tempo todo para a cisma, o "nonsense". Pão-pão, queijo-queijo ou preto no branco sumiam logo da mesa em que ele se sentasse. A irrealidade criadora, leve, tomava o lugar da lógica que mesmo num bar tende a nos escravizar.

No meio de alguma conversa mais insistente, ou de pessoas que exigem respostas claras e contundentes, ele gostava muito de apelar para os versos. Citava de repente um nome de poesia, ou recitava. Em português ou em inglês. Bloqueava o caminho de qualquer conversa chata com a pedra de Drummond. Ou adorava degustar e comentar as primeiras linhas do poema de T.S. Eliot: "April is the cruellest month". Por que será abril o mais cruel dos meses? Sem dúvida porque vem depois das águas de março.

Em 1987 morreu nos Estados Unidos um artista que, como Tom Jobim, foi de necrológio difícil. Cantava com um filete de voz que era um filete de água pura. Dançava e sapateava –mesmo encartolado, de casaca e sapatos de verniz– como se tivesse aprendido o truque dos saltos pela receita de Nijinski, que era subir do chão com toda a força e descer bem devagarinho.

Chamava-se Fred Astaire e consolidou sua fama, leve e fina como a de Tom, a partir de 1933 em "Voando para o Rio", filme em que apareceu pela primeira vez dançando ao lado de Ginger Rogers. Fred Astaire ficou como um sonho americano de graça e espiritualidade, que nunca se materializou de novo. Temo que Tom Jobim, em essência, continue nos escapando e fique para sempre inatingível.

Restam as músicas, graças a Deus, os filmes e os livros, mas a capacidade de saltar da realidade de repente e só voltar ao chão bem devagar, essa infelizmente não grava, não filma, não imprime. É verdade que ficam, também, as mansas piadas. Terça-feira, na plena badalação do Jardim Botânico, julguei ouvir de repente a voz de Tom, me dizendo num cicio de folha: "Não precisava ter tanta gente pisando na grama".

Finalmente, quero sugerir aqui um dos possíveis meios de preservar a memória de Tom Jobim. Eu pediria a algum dos seus tantos amigos pintores e cartunistas que tentasse guardar para os vindouros o mapa do Rio de Janeiro de Tom, fincado no Jardim Botânico e deitando raízes na direção da Plataforma e da Cobal do Leblon, seus refúgios prediletos dos últimos tempos, e dos bares e boates do passado, em que ele primeiro apareceu ao lado de Vinicius, antes de se cruzarem os dois como placa, respectivamente, de avenida e rua, em Ipanema.

O que me deu a idéia foi um antigo mapa de Nova York desenhado por Saul Steinberg. É a ilha de Manhattan, cercada por seus três rios e dividida em condados paradisíacos que se chamam Bordeaux, Bourgogne, Slivovitz, Dom Pérignon.

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